sábado, 12 de setembro de 2009

Era uma vez... (II)

... o Amor. Ele não era comportado. Ele não gostava de ficar quietinho. Ele se fingia dormindo, mas às vezes me surpreendia de forma a me deixar tonta e sem reação. A estátua que fazia dele era cheia de belas rachaduras, o amor esculpia maravilhosamente bem; e ele, meu chavalier, nem sabia... Curioso como tudo ficava no plano da sutileza, e as trocas de sutileza sempre estavam mascaradas demais pelos preconceitos e dogmas pré-impostos para serem notadas e levadas em consideração. Eu queria correr e saltar na direção daquilo que minha cabeça me dizia ser o certo; minhas emoções fluiam ao um mesmo lago que minha razão. Eu olhava a figura do meu lado: ser desprovido de grandiosos talentos, ser desprovido de grandiosas demonstrações. Pessoa, unitária sim, mas massificada num sistema de trocas de interesses que me pareciam tamanho desinteressante...e eu o olhava. Via nele ali uma porta para coisas inimagináveis; sorrisos, saudades, romances sacudidos e explosivos, contidos sempre em sussurros... Eu via aquela que estava no lugar onde eu queria estar. Eu via seus talentos, suas qualidades, e pequena me sentia. Enquanto isso, aquele ao meu lado traia a si mesmo traçando os padrões belos e perfeitos daquele que eu amava em segredo: seus talentos, seus humores, suas tendências, tudo me levando a amar mais e mais. E quem estava ao meu lado nem imaginadva que atirava contra a própria cabeça! Uma moral e um amor fraternal me faziam guardar cada vez mais aquele amor, mas nos meus silêncios prolongados, nos meus suspiros ansiosos, tudo que eu via era aquela realidade paralela. E então eu desejei amor correspondido. E então eu desejei a chance da moça ao lado dele, e eu desejei um pedacinho, mesmo que mínimo daquilo que os dois compartilhavam. Eu sonhava acordada, tremia sob os olhares e gelava à voz firme e suave. 
Eu olhava cruelmente para a situação. Eu via nos erros do que estava ao meu lado mais qualidades para meu amado, eu via as faltas que ele tinha, que meu amado não possuia. Eu via seus dons, suas nuances, seu jeito de segurar o copo, a forma de se curvar gentilmente para beijar a minha mão... Mas a verdade era que não havia nada o que eu pudesse fazer; meu amado era melhor amigo daquele ao meu lado. Era um crime, um terrível crime pensar daquela forma. E, por isso, eu decidi que fingiria que não pensava aquilo. E consegui fingir bem.

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