terça-feira, 9 de dezembro de 2008

É lá que mora o doce mais doce,
o bem-querer mais bem-quisto,
todas as graças das mais graciosas,
o fermentado e destilado sumo deste fruto carnoso e demasiado branco,
o lenço profundo das lágrimas que desmancham os olhos de saudade...
Perdido por todos os lados, ofuscado pela luz matinal de um sentimento que cisma em nascer e se pôr, dia a dia, por todos os segundos que preenchem o existir dessas duas metades: a de cima, e a de baixo.
Desgostosa a distância entre estas, se novamente se unem, abafam o som maldito; mas se se aproximam, e se apertam uma na outra, suas cores se tingem em rubro vivo, e logo amanhecem no mais pueril sorriso que já riscou tal face...
Acima de tudo, é o local mais seguro do mundo, onde mora os mananciais do descanso mais terno, e morno... A casa de tamanha quimera de beleza e plenitude, a casa dos justos, e dos intuitivos. Uma casa onde pouca razão reina, onde se espelham as batidas mais fortes do miocárdio, onde se pode ler alguns segredos - apenas os tolos - e onde desabrocham os mais escondidos mistérios das emoções humanas.
Poderia viver - e sobreviver - dessas duas bem-feitas metades, que mesmo silenciosas, possuem toda uma voz e sua canção própria. Mas não poderia viver - em plenitude! - sem esses dois pedaços, essas duas partes - a de cima, e a de baixo - de calma, furor e majestade... Essas metades que dão asas a minha poesia.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Os Ossos

A fibra das carnes agarram-nos, e bambeiam-se pelos tendões. O sangue lhes corre de ponta a ponta, as moléculas incipientes de suas superfícies porosas prendem-se e desprendem-se deles como se lhes fossem indiferentes... E eles, duros, rijos, mas frágeis, vibram...
Sacolejantes, presos pelas beiradas, vibram a energia de existirem. Vibram ritmos e canções de todas as partes do mundo, vibram desejos e arrepios da pele, vibram crispados de protuberâncias confusas e desdenhosas, vibram rompendo as vísceras e contundindo as espécimes variadas de emoções. Vibram por terem vida própria, vibram pela sensação de existirem, vibram independentes de tudo, independentes de seus próprios donos. Seu chacoalhar confuso movendo o resto pelas ondas teimosas do ser e do não-ser, oh, os quereres que guardam!
Ao aproximarem-se do quisto, remexem de um jeito inimaginável, logo tomam o controle e fazem das diferenças um motivo para unir! Impressionam pela teimosia, suas paixões misteriosas adormecidas entre material duro e quase sem vida, a rigidez sensível de seus súditos - oh esqueleto! - das vontades misteriosas e das coisas que nunca contamos, essa casca interna no corpo, espectral quando a vida se esvai e larga apenas pedaços de existir em memórias alheias...
permanecem incompletos, suas vontades intactas, seu existir um mistério! Em ti viveria o elixir da vida? Pois é de ti que a existência Oh, ossos! - veja só como são! - essa escarne de pequenices, essa excência branca do existir, os guardiões do tutano - e dos desejos tutanais - e das graças enraizadas que apoiam o existir dos humanos. Oh, ossos, seus mistérios tutanaisefêmera e tola desses seres sem metade se completa na terra, onde todos hão de ser iguais.

domingo, 7 de dezembro de 2008

O que fazer com aquela maldita ânsia?
Ela vem rasgando a carne, sendo cuspida em chamas do meio dos miolos e largando um rastro ardido pelos feixes musculares! Intensa, vem arrastando consigo as vontades misteriosas que nem ao menos entendemos porque moram lá... Vem o grito, vem a força de escapar de tudo, vem a degustação dos ventos de primavera, vem o poder de romper o infinito áspero e sem paredes...
E logo, me acabo, me basto de lábios bem-feitos, os mais plácidos que já vi...
Um arrepio na pele, as mãos que continuam iguais, a saudade se dissolve em meio às palavras sem ambição alguma, sussurradas suavemente à altura do ouvido, arrastadas entre a lama e árvores - quem seria melhor confidente que elas? - e depois a chuva, e então os livros, calados, começam a falar...
Como cogitar que um querer bem quisto caminharia por tantas pedras e continuaria quase intacto, quase sem ondas, quase sem marcas? Só pode ser realmente pureza, daquela que achamos só ver nos filmes, pureza rara daqueles que estiveram murados esperando. Aqueles que souberam baixar a guarda apenas no momento certo. Daqueles que ficaram marcados como os insensíveis, e que lidaram com o mundo como quem lida com adultos grandes e maus. Daqueles que aprenderam cedo que confiar é perigoso de mais para se dar ao desfrute de confiar em todos facilmente.
E logo os lábios se afastam, esboçam um sorriso e rosam pela percepção de serem observados, mostrando graça além da graça, timidez além de timidez, e além de tudo, temor além de temor. Impossível explicar.
Talvez esse poder que as pessoas que amamos tem de nos ferir.