sexta-feira, 1 de junho de 2012

XXXIII

Amei o silêncio antes de amar a canção
amei o vazio antes de amar o pleno
amei o rasgado antes de amar o fechado
cria do vazio rasgado silêncio.


Amei a beleza antes de amar a essência
amei a matéria antes de amar a escultura
amei a mão antes de amar o homem
a matéria da beleza nas minhas mãos...


Amei as notas antes de amar o arco
amei o sorriso antes de amar a respiração
amei os pés antes de amar os passos
e os pés nas notas e os sorrisos.


Amei os folíolos antes de amar a cabeleira
amei a taça antes de amar o vinho
amei a camisa antes de amar o peito
e a taça com a camisa e os folíolos.


Amei o lampejo antes de amar a luz
amei os segundos antes de amar as horas
amei o produzir antes de amar a obra
e o produzir segundar dos lampejos.


Amei o queixo antes de amar o violino
amei a barba antes de amar a boca
amei o arqueado antes de amar o arquejar
e o arqueado queixo sobre a barba.


Amei a emoção antes de amar a vontade
amei o real antes de amar o sonho
amei a ilusão antes de amar a verdade
e a ilusão do real com emoção.


Amei o som antes de amar o silêncio
amei a memória antes de amar a visão
amei o geral antes de amar os detalhes
e o generalizar das memórias dos sons.


E amei o que pensei sentir
e amei o que havia de ser
e amei o que poderia deixar de sentir
mas escolhi tentar possuir


E amei o que gostaria que fosse
e amei o ser que jamais havia sido
e amei o haver de ser
e o que havia escolhido


E amei o que jamais vai o ser
e amei o que sonhei que seria
e amei o que sonho que pode ainda ser
e o que ainda pode haver.


Amar por amor é melhor que amar por ter ou querer.

Uma reflexão emotiva sobre o artista plástico.


O artista plástico não é um imitador; ele é sim, antes de tudo, uma lente que vê as coisas com um olhar interno, passando assim a imagem pela sua alma e depois sendo esta reproduzida.
O artista plástico deve ser um amante da forma, do saber de se ver e das sensações do ato de olhar.
Ele deve amar as outras artes, pois assim como a que ele pratica, ela é aquilo que a alma vê e é traduzido como obra; ele deve ser, mais que um pensador independente, um "sensoreador" independente: não apenas no olhar, mas no ouvir, no tocar, nos sentimentos até. O tipo de pessoa que tenta expressar, para que sejam vistos, os sentimentos que ele não consegue colocar em palavras diretamente.
Ele deve ser um poeta do olhar, um músico do olhar, mas também um experimentador, assim como um cientista o é: provar, antes de todos, com bom gosto e bom senso, aquelas sensações que sua obra lhe causa. Mas também precisa estar ligado a sua obra de uma maneira que nenhuma outra pessoa jamais estará, senti-la independentemente, como indivíduo.
Apesar de sempre manter sua individualidade, ele precisa se ligar ao mundo, não importa de que maneira seja, ainda que seja o mundo interno que liga um e todos, buscando um subconsciente de ritmos e causando espanto, desgosto ate, ou carinho: mas sempre causando algo.
O artista plástico é, acima de tudo, assim como todo artista, um criador de mensagens que as pessoas não conseguem expressar com simplicidade. Ele deve traduzir o que não é falado, o que não é facilmente descrito, e criar uma pequenina marca, mínima mesmo no meio de tantas outras, que gere por si só um eco, e assim mesmo que sutilmente, mude um geral de pensamentos emaranhados na cabeça de seu apreciador.
Ele deve ser, como os outros artistas, a voz do silêncio no âmago dos outros, ainda que não perceptivelmente. Ele deve ajudar a descobrir, ou traduzir, ou mesmo alcançar experiências nos outros, mesmo que não em todos, mesmo que sua obra jamais esteja em mãos de pessoas que jamais alcançaram isso através dela; ela deve buscar independência do coletivo, e ao mesmo tempo tentar atingir mesmo que uma única pessoa que caminhe nesse mundo.
E esse é o meio que eu creio gerador de obras-primas.