Uma corda dependurada oscila de um lado para o outro. A alma assídua, os olhos cansados. E chegando a hora da sentença final. Contra o nascer do sol, ainda pálido, o laço se dependura e forma uma cruel moldura: ele, sentado, agarrado entre as grades, se encolhe de medo; esse destino ele jamais imaginou para si. Ele chora muito; as lágrimas que chora, de tantas, cavaram seu rosto por onde escorrem, formando uma calha funda; abaixo dos olhos, de tanto esfregar, marcas arroxeadas em tom escuro, quase hematomas. As mãos cortadas, assim como os pés e braços - cortes tão fundos, dos quais perdeu tanto sangue, que sua palidez mórbida se acentua contra o tom cinzento das pedras. Ele dá um último grito; as grades, as paredes pedrosas, todo o calabouço úmido com cheiro de decomposição e morte, todo o chão pegajoso, tremem. Resposta? Apenas silêncio. Um braço o agarra e o encaminha para palanque: eis ali minhas mãos. Mãos fortes, destemidas, e repletas de desesperança e sofrimento. Olho a multidão, e consigo ver ainda algum brilho nos olhos do juiz; ele olha suavemente, sente que está fazendo o certo. Mas na verdade, já não importa o que é certo ou errado. Eu, carrasca, levo-o até o palanque: ajeito-lhe tudo com todo carinho - sou carrasca, assim como meu pai, pai do meu pai, e assim como uma maldição, isso me leva apenas ao caminho que não escolhi. A corda em seu pescoço, passada delicadamente; um capuz preto sobre seus olhos, outros sobre meu rosto. Ofereço-lhe cigarros, um beijo de despedida, e o vejo como quem olha um filho bastardo e mal-quisto. Olho para tudo que tem acontecido a mim, depois tudo que tem acontecido - oh, tragédia! - a ele!!! Ele que tanto criou, que tanto cultivou, que tão fiel foi... Uma contagem, as badaladas do sino explodindo na aurora, agora completa. " Adeus" sorrio, mesmo sem sorriso, e lhe sussurro coisas boas que ficaram no final. Não gasto quase tempo nenhum, e aí, ele consegue me entender. Ele consegue me sorrir. "Blém!" Diz a última badalada do sino. Uma última lágrima é derramada. Por mim, por ele.
"Estamos aqui hoje para execução desse Amor - Amor-carnal, amor-emocional, amor-afinidade, amor-esperança, amor-amizade. Ele é acusado do crime de mais alta traição e será dependurado, por esse laço, até parar de respirar e seu coração parar de bater." proclama o juiz. Sua sentença dada, tudo preparado. Viro a cara para chutar o banco, sem ao menos dizer adeus ao pobre Amor... Viro-me e contemplo ele dependurado, se retorcendo, e por um segundo, de tolice extrema, vejo que sou a única que pode salvá-lo... a única que realmente se importa com ele, a única que realmente quer que ele fique. Mas um Amor ferrado assim só traria sofrimentos além dos que já trouxe. Deixo ele morrer, nem quero ver o corpo. Agora é com o Coveiro.
E é assim que o Amor acaba: ele nasce forte, cresce bandido, vive por um tempo assassino, e depois é assassinado - até a hora de encontrar a pedrinha verde da verdade.
Morra, Amor, morra, desapareça desgraça maldita e inútil. Vais escoando embora, com cada vez mais força. Vai de vez, e deixa espaço para eu ser feliz. Vai, e não volta jamais.
Amor, grande Amor... Você não passa de segunda.
Amor fora de sintonia
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Quando eu quero sua atenção, você me dá um novo outro assunto
Se em um dia você me quis, com outra eu estava antes
Nosso amor sempre esteve fora de sintonia
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