Como pude deixar-me acabar tão longe de mim?
Como pude permitir que tudo que eu sempre quis fosse destruído, despedaçado e mirrado por mim?
Oh, sou tua ghost, tua Lacrimosa, tua esfinge.
Estar e não existir, existir e não viver. Ou não estar, não existir, não viver?
Novamente sinto-me atraída aos vales das cruzes de mármore pelo perfume sedutor e adorável de criptas... Poder extirpar por fim esses suspiros ardidos e deficitários, flutuar além dessas moléculas e mergulhar na fúria do mar e de lá não ter de sair!
Eis que novamente vem ela: minha musa, minha senhora, essa incrível dama de tamanha beleza, que é proibida e foi coberta, pelos anos, pelo seu manto negro. Meu maior amor, minha espera, meu querer supremo, minha extrema unção.
Desejar-te voltou para me atormentar. Meu repouso se quebra, juntamente com todos os meus sonhos onde você não está. Você surge, ampara-me, mas nunca posso te tocar. Por você eu seria um homem, por você eu seria um sorriso, seria uma espada de prata. Não mais este réquiem.
Acordei com o mar nos olhos. Era saldado, deigado e arredio, buscava intensamente o chão. Esta ventura pode estar, então, chegando ao seu fim? Eu era vapor, era apenas uma essência gelada e sem existir algum, e logo nem mais o vapor frio e pegajoso do teu ar eu poderia ser.
O mar veio, revolto, e se jogou contra mim. Deslizou pela minha face, e depois escorreu - acre e sosso - pelas minhas entranhas vermelhas e adocicadas ainda de suspiros. Foi apodrecendo meus ossos vibrantes, meu baço repleto, e apagou o fogo do meu coração. Já não podia mais queimar-te, já não podia mais ser aquela pistola, era o desconstituir da criação, lento e dolorido, a cada segundo. Não queria parar o mar. Apenas dessa forma pude ver o fogo - o fogo destrutivo - e sentir que ele não estava mais ali.
Os passos sem jeito ficaram mais sem jeito, já não havia mais os apoios naturais para os braços ficarem; ambos membros pendiam apenas pela gravidade, à espera de serem arrancados por ela. As madeixas mal aparadas agora eram a última máscara, e mais que máscara eram a protecção contra o tudo de lá de fora. As palavras se desarticulando, perdendo seu significado, apenas deslizando suas ondas pelas moléculas repressoras a toda volta. Logo as ondas perderam o motivo de vibrar. Era apenas o ar que se afastava, e depois, nem mais era o ar. Era apenas o vibrar de minhas moléculas, a electricidade correndo. Mas o chamado, apesar de surdo, ainda lá estava. Nenhuma resposta. Apenas pena. Uma pena que não era para ter estado ali nunca.
As luzes fortes de aurora começaram a perder a forma, depois foram enfraquecendo, e apesar de significar que outro dia havia começado, não eram luzes ternas, nem quentes. A agressividade delas fizeram-me me cerrar ainda mais, e uma beirada rosada ficou pendurada para fora. Uma beirada que precisava - mais que tudo. - ser extinta. A necessidade de absorver o meio desaparecera; foi substituída por um entorpecimento suave, sem corpo, sem existir. Faltavam ainda dois passos, passos bem curtos para serem dados. A matemática, minha melhor conselheira, seria a peça que faltava para que um desses passos fossem dados. O outro, era preciso um esforço mais descomunal. No entanto, para poder deixar-me voar, sabia que o último passo jamais deveria ser dado. Que deveria ser ignorado nos caminhos estranhos que eu escolhera. O ser humano tem essa linda capacidade de se conformar.
E esse mar, malditíssimo mar, ele não terminaria de mim o que começou. Era melhor voar, e deixar apodrecer longe de mim esses pedaços sangrentos que nomearam.
Minha matemática, tamanho querida, dessa vez não tinha o poder de mudar aquele caminho. Era o nada, ou o nada. Era o nada daqui, ou o nada de outro lugar. No fim, o olhar ainda seria esfumaçado, e sem graça alguma.
Pude olhar uma flor que havia sido atirada no mar, na noite anterior, e vomitada por ele pela manhã. Para meu desespero, estava tão desfigurada, que consegui nela um espelho de verdade. E também nela, tive uma visão do futuro. Não podia deixar, de forma nenhuma que tu visses, com teus olhos castos, como ficaria a rosa depois que foi devorada pelo seu próprio mar.
Amor fora de sintonia
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Quando eu quero sua atenção, você me dá um novo outro assunto
Se em um dia você me quis, com outra eu estava antes
Nosso amor sempre esteve fora de sintonia
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